segunda-feira, 23 de maio de 2011

Pré-românticos - Anastácio da Cunha

José Anastácio da Cunha (1744-1787) nasceu em Lisboa e seguiu a carreira das armas. Esteve algum tempo a fazer serviço em Valença como oficial de artilharia, sendo nomeado pelo Marquês de Pombal lente da Universidade de Coimbra devido aos seus profundos conhecimentos de Matemática. Além de obras sobre essa disciplina, escreveu poesia. É considerado um dos pré-românticos portugueses. As suas obras poéticas foram publicadas em 1836 sob o título de Composições Poéticas. Em 1826 foi publicada em Paris A Voz da Razão.

http://alfarrabio.di.uminho.pt/vercial/cunha.htm )




Os Porquês do Amor

Céu, porque tão convulso  e consternado
Me bate, ao vê-la, o coração no peito?
Porque pasma entre os beiços congelado,
Indo a falar-lhe, o tímido conceito?

Porque nas áureas ondas engolfado
Da caudalosa trança, inda que afeito,
Me naufraga o juízo embelezado,
E em ternura suavíssima desfeito?

Porque a luz dos seus olhos, tão activa,
Por lânguida inda mais encantadora,
Me cega, e por a ver, ansioso, clamo?

Porque da mão nevada  sai tão viva
Chama, que me electriza e me devora?
Os mesmos meus porquês me dizem: - Amo!

****

Ondeados, lindíssimos cabelos,
         Um rosto encantador, enamorado,
         Em cada face um pomo sazonado
         Das purpúreas flores são modelos.

Um meigo coração que faz ter zelos
         Ao coração mais terno e sossegado;
         Uma voz carinhosa, um doce agrado,
         Um riso natural, uns dentes belos.

Tudo possui Marfida! Oh! quem pudera,
         Doces prisões rompendo do segredo,
         Explicar-te a paixão que na alma impera.

Enfim, voltar-se a voz... mas, oh! que medo,
         De mais um desengano que me espera,
         Mais imóvel me deixa que um rochedo. 

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